Reforma do curso de economia: Processo e indignação

O Visconde
5 min readJul 20, 2021

Por Bruno Pereira de Pinho e Arthur Mello

Pra quem não me conhece ,prazer, eu sou o Binho, fui representante discente do departamento de economia em 2020, no ano da reforma, e participei de todo esse drama. Representante discente é o aluno que participa dos órgãos de decisão da FEA representando os estudantes.

Bom, o processo da reforma começou lá por 2018, quando o prof. Alexandre Saes (antigo coordenador de economia) ficou com essa tarefa de propor uma reforma pro curso. Ele estava em um processo super legal, fez vários eventos, conversou com alunos e propôs no início de 2020 uma reforma, e era uma reforma bem básica, bem direta que ia ajudar bastante, adicionava Atividades Acadêmicas Complementares, sugeria a reformulação do conteúdo a ser dado por disciplinas que apresentavam baixo desempenho de acordo com a pesquisa de opinião dos alunos (Por exemplo a matéria de Direito ou de Matemática Aplicada à Economia) e retirava algumas optativas que não estavam mais sendo lecionadas.

Na minha opinião estava bem verossímil e prática, mas na reunião do departamento, reunião onde participaram cerca de 15 professores, alguns deles começaram a causar confusão, alegando que deveriam retirar Introdução a Ciências Sociais porque não havia disponibilidade de professores, que havia muita matéria de História Brasileira no currículo e por aí vai…

E essas críticas foram escalando, até que o prof. Sérgio Almeida se juntou com o prof. Fernando Botelho (professor que saiu da FEA entre o final de 2020 e início de 2021) e foi apresentado ao departamento uma outra proposta de reforma, era uma reforma mega gigante, vinha com as ideias de trilha, honrarias acadêmicas, mudanças no TCC, o programa de oportunidade de pesquisa e com uma grade desproporcionalmente técnica, matemática e academicamente pesada.

Com o tempo, a coordenação do curso foi deixada de lado dessa elaboração, que ganhava interesse pelo departamento. O prof. Saes decidiu então sair da coordenação e foi substituído pelo prof. Rafael Ferreira como coordenador, que era mais simpático à essa reforma.

E aí se inicia o grande processo, foram várias reuniões discutindo as grades, várias reuniões comigo e com o Arthur (que era representante junto comigo) querendo falar com os professores, postando coisa no Facebook pra levar o debate pros alunos e os professores favoráveis à reforma querendo tirar a Disciplina de Direito, de Ciências Sociais de Formação Econômica e Social Brasileira. E não me levem a mal, não sou nenhum maluco que vai ser contra a inclusão de Introdução à Computação, mas fazer isso a custo de disciplinas igualmente importantes é atentar contra uma grade que não seja metodologicamente enviesada.

E sinceramente, o clima das discussões não eram boas, parecia que alguns professores não queriam que a gente participasse do processo de discussão, sentia em diversos momentos meu trabalho como representante sendo desrespeitado e colocado pra baixo. Não entendo como um professor pode negligenciar a atuação de um aluno em um processo tão interessante como esse, reclamam tanto quando ficamos calados durante as aulas e quando soltamos nossa voz em assuntos que nos interessam não estão preparados para escutar e nos incluir?

Fizemos uma assembleia de estudantes de economia e um formulário pra mostrar a posição dos estudantes, colaram umas 160 pessoas na assembleia e foi muito ativa. Também fizemos um formulário de opinião, que teve 500 respostas, com ele fizemos o relatório de opinião, algo que deu bastante trabalho mas tá bem completo, segue aqui: https://drive.google.com/file/d/1MkTDO0tYoncVPXJ0xnvB8Bf-zYFsuycF/view?fbclid=IwAR2Gzw-mmsqlnKrtWOD0hwFHfNv9qAuVpglrAgGHGs2B8MxciRufoIt8A_g

Chegamos a apresentar esse relatório pros professores, marcamos uma apresentação e tudo, mas dois dias depois houve a reunião do departamento e entre alegações de que já tinha tido muita discussão (por mais que os alunos estivessem se manifestando falando que deveria haver mais) foi votado entre 16 professores e 1 aluno a nova grade de economia, aprovado por maioria. Isso tudo ocorreu em 2020.

Esse ano a reforma foi aprovada pela Congregação, o órgão de decisão máxima da FEA. Para explicar um pouco, todo o curso tem um PPP, que é o Projeto Político Pedagógico, que fala sobre os objetivos, motivações, disciplinas, grade curricular etc. Pouquíssimas reuniões da coordenação ocorreram esse ano para discuti-lo, mesmo assim o PPP foi atualizado com os pontos da reforma sem ser acompanhado de nenhum plano de transição.

Reformas na USP seguem o caminho: Coordenação do Curso > Conselho do Departamento > Comissão de Graduação da unidade > Congregação da Unidade > Órgãos nivel USP.

Em 2020 a situação já começou estranha porque pulou a fase da Coordenação do Curso e foi elaborada pelo Departamento, na Comissão de Graduação o PPP de economia foi apresentado quase que como uma pauta surpresa e apressada. Sendo o PPP do curso de Economia da FEA, acredito que merecia ser levado mais em consideração.

Em junho de 2021 o PPP foi discutido e aprovado na Congregação. Nesse ano sou representante discente desse órgão e declarei: “Não serei a favor de um PPP que tenha uma reforma que contém um nível de rejeição alto pelos alunos, pela forma que foi o processo de aprovação e principalmente porque não tem nenhum plano de transição, pro nível que são as mudanças precisamos de um plano bom de transição”. Aguardamos, enfim, a passagem do PPP pelos órgãos da USP para sua efetivação.

O processo da reforma da economia é sem dúvidas conturbado, independente de acharmos se é o melhor ou pior para o curso de economia da USP. Mesmo assim, é importante não ignorarmos as questões e perguntas que o episódio nos traz. Tanto perguntas que tenham a ver com o papel do estudante na faculdade pública, como: O que ele ou ela veio fazer aqui? É permitido que se participe de construções importantes aqui dentro ou só lá fora? Estamos, como alunos, confortáveis e/ou animados em contribuir para a faculdade? Quanto às questões metodológicas: O que significa ver que a grade de economia agora possui mais carga horária e muito mais apelo técnico-matemático? Que tipo de pessoas serão atraídas por essa grade para a FEA? Que tipo de profissionais serão formados com essa apresentação da economia?

Enfim, compartilho da preocupação dos alunos com relação a transição, fico preocupado como vai ser planejada para 2022, e além das diversas dúvidas de equivalência de matérias e alocação de professores tenho muitas outras com relação ao processo, deixo-as aqui: Por que o processo começou pelo Conselho do Departamento e não pela Comissão de Coordenação do Curso? Por que a reforma foi proposta e aprovada no momento da pandemia? Por que foi escolhido passar a reforma pela Comissão de Graduação sem um plano de transição? Por que não há, até agora, nenhum plano de transição ou de readaptação da grade caso não seja bem aceita? Por que não havia nenhum aluno na Comissão da Reforma?

Por que uma decisão dessas, que muda a vida de todos os alunos e professores, presentes e futuros, foi decidida com o voto de apenas 16 professores e 1 aluno?

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